João Otávio de Noronha debateu com Eduardo Maneira, Bruna Marengoni e Maria Melo Egídio o custo processual de litígios por terceiros, no Fórum Impactos Econômicos e Sociais dos Litígios de Massa.
O segundo dia de debates do Fórum Impactos Econômicos e Sociais dos Litígios de Massa começou, nesta sexta-feira (29), no CCB, em Lisboa, com a discussão sobre o Financiamento do custo processual de litígios por terceiros. “Esta é, se calhar, uma das questões mais sensíveis e polêmicas das ações coletivas”, antecipou a moderadora Paula Vaz Freire, professora da Universidade de Lisboa (FDUL), antes de passar a palavra para Eduardo Maneira, advogado e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O especialista começou por convocar a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) a se juntar verdadeiramente à causa.
“A OAB tem o dever de participar dessa luta para identificar os advogados que praticam esta abusividade tão nociva ao Judiciário”, afirmou, para na sequência emendar: “O abuso do direito de demandar obstaculiza o acesso à Justiça do cidadão, que não abusa do seu direito”.
Advogada e sócia do BTG, Bruna Marengoni defendeu a posição dos financiadores, ou antecipadores, como se referiu aos fundos, bancos e escritórios que custeiam ações. “Quando eu invisto meu dinheiro, o que eu mais quero é o fim do processo, porque eu quero ter devolvido este recurso que investi na ação. Os financiadores são uma parte que está fazendo conta e verificando qual é o melhor momento para sair do processo. Trazemos racionalidade para o processo judicial”, defendeu.
A especialista também citou que, antes de assumir a demanda de empresas, por exemplo, os financiadores exigem que não existam dívidas trabalhistas ou fiscais ativas, de forma que, ao mesmo tempo em que abrem uma nova demanda na Justiça, fecham outros processos. “No Brasil, a gente tem custas baixas e a cultura do honorário de êxito. Quando penso que vou financiar a ação, eu penso: vou financiar o quê? Pois os custos são muito baixos, é muito fácil de acessar a Justiça do Brasil. Na verdade, o mercado se desenvolveu voltado para a antecipação de recebíveis”, frisou.
O ministro João Otávio de Noronha, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), destacou que é preciso “caracterizar bem o que é financiamento de terceiro, ou seja, aquele que não integra a ação judicial da qual não é parte. Se não integra, não é assistente, não tem participação como terceiro. Ele faz um contrato que é estranho ao processo. Este terceiro financia com qual propósito? Participar do resultado do processo. Ele assume risco, e este risco que ele assume não divide com a parte. Porque, se perder a ação, não tem devolução do dinheiro financiado”, expôs.
Noronha questionou ainda o que considera se tratar de uma espécie de operação de crédito no recurso. “É uma modalidade de financiamento não baseada na capacidade financeira, mas em razão do potencial econômico do litígio”. O ministro destacou também que o que legitimou o financiamento foi estabelecer uma paridade de armas, uma igualdade das partes em sentido substancial. “Os fundos entram para financiar, para contratar um bom advogado, um bom parecer. Inclusive, empresas que não querem comprometer o seu caixa com os custos de litígios passaram a entregar a demanda para que um terceiro administre e tenha participação no lucro. Estamos a transformar a ação judicial num commodity, a fomentar o aumento das demandas frívolas e a abusar do Direito?”.
Noronha apontou a necessidade de mudanças num sistema Judiciário falido. “Nós temos que garantir o acesso, mas um acesso responsável. Isso é um sistema falido e prejudica quem verdadeiramente quem tem direito, sem contar o custo do carregamento do processo. Isso precisa ser enfrentado”, salientou. O painel teve ainda a participação da professora Mariana Melo Egídio, assistente convidada da FDUL, e o professor João Ilhão Moreira, da Universidade de Macau (online). O Fórum Impactos Econômicos e Sociais dos Litígios de Massa é uma realização do FIBE, com o apoio da FGV Justiça e do IDP.