Representantes da Anvisa e da Anatel falaram da regulação sob perspectiva horizontal em painel realizado no II Fórum Futuro da Regulação.

O crucial tema da Regulação Responsiva nas Agências Reguladoras foi debatido na tarde desta quinta-feira (27), durante o II Fórum Futuro da Regulação, na Academia das Ciências de Lisboa. Especialistas e autoridades levaram o foco do debate para o Brasil, com representantes da Anvisa (Vigilância Sanitária) e Anatel (Telecomunicações), enquanto a moderação de Paula Vaz Freire, professora associada da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, fez contraponto importante com a Europa.
“O tempo da regulação é incompatível com o das transformações digitais”, iniciou Alexandre Reis Siqueira Freire, conselheiro da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), que falou dos 28 anos da Agência. “Apenas fiscalizar e multar não rendia mais benefícios à sociedade. O estoque de multas que resultava em processos gerou para a agência um grande custo. (…) A Anatel fez, então, um exercício de reflexão institucional”, disse. Para Alexandre, “todos nós participamos de um ecossistema regulatório” e é necessário “repensar o modelo e apostar em um diálogo mais pedagógico, sem ser professoral”.
A Anatel passou a converter multas em obrigações. “Chamamos à mesa para um diálogo e encontramos, em comum acordo, que o valor daquela multa fosse convertido em investimento”, contou Alexandre, que citou o exemplo de uma multa de 8 milhões de reais da Claro que foi convertida em capacitação e letramento digital de mulheres vítimas de violência doméstica e em situações vulneráveis, em uma parceria com a ONU Mulheres. Outro exemplo foi uma multa de 30 milhões de reais de uma operadora que foi convertida para levar 4G para comunidades quilombolas.
Confira a cobertura em imagens e textos do II Fórum Futuro da Regulação
Pedro Gonet, professor do IDP e diretor do departamento jurídico da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), disse que a “regulação responsiva é uma das coisas mais maravilhosas que existem”, que é também seu objeto de estudo no doutorado. Gonet também abordou a superação dos modelos estritamente verticais e coercitivos. “O comando e controle é exaustivo. É preciso aproximar a empresa do regulador. (…) Do meu ponto de vista forense, a regulação responsiva é o melhor caminho a seguir. Não vai deixar de punir quem precisa ser punido, mas precisa analisar o contexto”, afirmou.

“O mais importante é assegurar a cultura do cumprimento das regras”, afirmou Marcelo Guaranys, economista e advogado especializado em regulação, que deixou a Autoridade Nacional da Aviação Civil (Anac) há nove anos. Para ele, que analisa os motivos econômicos da regulação, as pessoas querem a segurança no consumo e que a regulação entra para criar regras de segurança. “A nossa regulação, no começo, é muito rígida, o que gera um excesso de multas, mas depois de um tempo pode-se flexibilizar”, disse. O advogado comentou os contributos da teoria comportamental na regulação e disse que a dificuldade da noção da penalidade atrapalha muito o cumprimento das regras.
Por sua vez, o diretor da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Thiago Campos, afirmou que, “ao definir a sanção, é necessário observar o que a gente quer com ela e dizer que é uma conduta que não é admitida e que deve ser evitada por todos os outros”. O diretor da Anvisa disse que a principal missão da agência é proteger a saúde das pessoas. “Na saúde, a gente regula por uma determinação constitucional. A gente regula com o foco de evitar que as pessoas estejam expostas aos riscos de adoecer”, disse. Campos apontou ainda o elemento da formação cultural latina, de “não reconhecer a autoridade pública como uma obrigação que constrange”. “Há sempre uma tentativa de encontrar brechas para o não cumprimento das normas. É aquela lógica de ‘aos amigos tudo e aos inimigos a lei’. A aplicação da lei já é vista como algo negativo. Por isso é importante transformar a sanção em indutor para a boa conduta”, concluiu.